Nene Lopes |
T S E
ACOMPANHAMENTO PROCESSUAL PUSH
DECISÃO
Vistos.
Vistos.
Trata-se de recurso especial interposto por Vildemar Rosa Fernandes, prefeito eleito no Município de São Miguel do Guamá/PA nas eleições de 2008 contra acórdão do e. Tribunal Regional Eleitoral do Pará assim ementado:
"AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO. CONDUTA VEDADA. ABUSO DE PODER POLÍTICO. CARACTERIZAÇÃO. MANDATO ELETIVO. CASSAÇÃO. EXECUÇÃO IMEDIATA.
1. A conduta estampada na exordial pode, a um só tempo, render ensanchas à sua visualização sob as nuances da Lei nº 9.504/97, como também sob a égide da Lei de Inelegibilidades. In casu, a aquisição e entrega de bem público municipal a entidade religiosa, dia 12 de julho de 2008, no fervor do processo eleitoral, em ato solene perfectibilizado em via pública, com participação direta e indireta do recorrente na consecução do ato, maltrata não só a isonomia que deve imperar entre os candidatos, como também tem o potencial (probabilidade) condão de alterar os rumos da eleição, pelo que dúvidas não há acerca da incidência de conduta vedada e abusiva.
2. Prova pré-constituída colhida em sede de AIJE, cujos fatos foram novamente valorados e confirmados em sede de AIME, sendo mister a cassação imediata dos mandatos dos recorrentes, tão-logo ocorra a publicação do acórdão pertinente.
3. Recurso de Vildemar Fernandes e Raimundo Freitas negado provimento; recurso da Coligação Unidos por um Guamá decente pra nossa gente provido"
Alega o recorrente, em síntese:a) violação ao art. 14, § 10, da Constituição Federal, aduzindo que a AIME não pode ser utilizada para apurar suposto abuso de poder político e conduta vedada, como ocorreu no caso, mas tão somente nos casos de abuso de poder econômico, corrupção ou fraude;
b) aplicação indevida do art. 14, § 10, da Constituição Federal ao caso, pois não houve abuso de poder econômico, corrupção ou fraude. Sustenta que a entrega de ônibus à Igreja Assembléia de Deus do município configurou apenas o cumprimento de obrigação pré-constituída, oriunda de convênio assinado em 28.5.2008 e cujo repasse de recursos ocorreu em 5.7.2008, antes do período vedado;
c) violação ao art. 73, §10, da Lei nº 9.504/97 e negativa de vigência ao art. 5º, LV, da Constituição Federal, por ter o TRE/PA aplicado penalidade de cassação do registro pela suposta conduta vedada prevista no art. 73, § 10, da Lei nº 9.504/97 sem previsão legal;
d) a cassação do registro do recorrente violou o princípio da proporcionalidade e da razoabilidade, decorrentes do devido processo legal substantivo (art. 5º, LIV, da Constituição Federal).
Aponta a existência de dissídio jurisprudencial quanto ao mérito e com relação ao descabimento de AIME para apurar suposto abuso de poder político e conduta vedada.
Relatados, decido.Trata-se, na origem, de ação de impugnação de mandato eletivo - AIME - ajuizada pela Coligação Unidos Por um Guamá Decente Pra Nossa Gente contra Vildemar Rosa Fernandes e Raimundo Monteiro de Freitas, respectivamente prefeito e vice-prefeito eleitos no Município de São Miguel do Guamá nas eleições de 2008, por suposta prática de conduta vedada e abuso de poder político, consubstanciados na doação de um ônibus à Igreja Assembléia de Deus no dia 12.7.2008.
O juízo eleitoral julgou procedente a ação e, com fundamento no art. 14, §10, da Constituição Federal, cassou o registro de Vildemar Rosa e Raimundo Monteiro de Freitas. Além disso, decretou a inelegibilidade de Vildemar Rosa para as eleições que se realizassem nos três anos seguintes ao pleito (art. 1º, I, "d" da LC nº 64/90).
Vildemar Rosa e Raimundo Monteiro recorreram, então, ao e. TRE/PA, que negou provimento aos recursos nos termos da ementa transcrita.
Contra esse acórdão Vildemar Rosa interpôs o presente recurso especial, no qual alega, inicialmente, violação ao art. 14, § 10, da Constituição Federal ao fundamento de inadequação da via eleita.
De fato, assiste razão ao recorrente, porquanto a AIME não é o instrumento processual adequado para apurar conduta vedada e abuso do poder político.
Na espécie, os fatos narrados na petição inicial da AIME não se enquadram em nenhuma das hipóteses de cabimento da ação de impugnação de mandato eletivo, quais sejam: abuso de poder econômico, corrupção ou fraude, conforme prevê o art. 14, § 10, da Constituição Federal.
A doação de um único ônibus a entidade religiosa poderia configurar, em tese, a conduta vedada prevista no art. 73, §10, da Lei nº 9.504/97, ou ainda, por hipótese, abuso de poder político. Nesse contexto, a jurisprudência desta c. Corte é pacífica quanto ao descabimento de ação de impugnação de mandato eletivo:
"RECURSO ESPECIAL ELEITORAL. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DE MANDATO ELETIVO. § 10 DO ARTIGO 14 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL: CAUSAS ENSEJADORAS.
1. O abuso de poder exclusivamente político não dá ensejo ao ajuizamento da ação de impugnação de mandato eletivo (§ 10 do artigo 14 da Constituição Federal).
(...)"
(REspe nº 28040, Rel. Min. Ayres Britto, DJ de 1.7.2008).
"Agravo regimental. Recurso especial. Negativa de seguimento. Ação de impugnação de mandato eletivo. Extinção sem julgamento do mérito. Abuso do poder político. Art. 14, § 10, da Constituição Federal. Não-cabimento. Decisão agravada. Fundamentos não impugnados.
1. Conforme consignado no acórdão regional, os representados "[...] teriam abusado do poder político ao fazer propaganda institucional no Diário Oficial, ao se utilizarem de e-mail do poder público para fazer propaganda eleitoral, ao organizarem evento eleitoral em repartição pública e, finalmente, ao empregarem bem público de uso especial na campanha política que então se desenvolvia" .
2. O desvirtuamento do poder político, embora pertencente ao gênero abuso, não se equipara ao abuso do poder econômico, que tem definição e regramento próprios (Ac. nº 25.652/SP).
3. Não é cabível ação de impugnação de mandato eletivo com base em abuso do poder político.
4. Para que o agravo obtenha êxito, é necessário que os fundamentos da decisão agravada sejam especificamente infirmados, sob pena de subsistirem suas conclusões.
5. Agravo regimental desprovido"
(AgR-REspe nº 25906, Rel. Min. Gerardo Grossi, DJ de 29.8.2007).
"RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO. MANDATO ELETIVO. TRANSFERÊNCIA. RECURSOS PÚBLICOS. UNIÃO FEDERAL. MUNICÍPIO. REALIZAÇÃO. OBRA PÚBLICA. DESCABIMENTO. CONDUTA VEDADA. INCIDÊNCIA. ART. 224 DO CÓDIGO ELEITORAL. PREJUDICIALIDADE.
1. A AIME tem objeto restrito e destina-se à apuração do abuso do poder econômico, corrupção e fraude e não à apreciação de conduta vedada.
2. Recursos providos.
3. Prejudicialidade do recurso cujo objeto era a aplicação do art. 224 do CE"
(REspe nº 28007, Rel. Des. Min. Marcelo Ribeiro, DJe de 23.9.2008).
Ante o exposto, com fulcro no art. 36, § 7º, do RI-TSE, julgo procedente o recurso especial eleitoral, extinguindo a ação de impugnação de mandato eletivo sem resolução de mérito, nos termos do art. 267, IV, do Código de Processo Civil.
Publique-se. Intimem-se.
Brasília (DF), 6 de abril de 2011.
MINISTRO ALDIR PASSARINHO JUNIOR
Relator